sábado, 17 de fevereiro de 2018

"AS MINHAS ASAS BRANCAS" - de Almeida Garret





Almeida Garret




Era menina. Naquela fase da vida em que tudo esperam de nós. É a Natação, o Judo, a Equitação e até mesmo que saibamos declamar Poesia. Este foi um dos poemas que aprendi. Aos anos que não o relembrava. Hoje, aqui está ele, "As minhas asas brancas", de Almeida Garret. Que saudade, meu Deus, do tempo que já vivi!... Serões em que sem TV ou computadores nos entretínhamos em amena cavaqueira até à hora de deitar. Na varanda da casa, no ameno da noite africana, ouvindo os grilos lá fora, a conversa saía tranquila e a descoberta de autores portugueses ia-se fazendo sem tempo nem pressas... O cheiro da terra misturava-se com o dos cabelos lavados antes do jantar. O tom, as pausas, a inflexão da voz, tudo nos fazia sentir crescer aos olhos atentos dum pai que nos mostrava: a música e ritmo da Poesia; a beleza das palavras e do jogo com elas...





"As Minhas Asas



Eu tinha umas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Que, em me eu cansando da terra,
Batia-as, voava ao céu.

— Eram brancas, brancas, brancas,
Como as do anjo que mas deu:
Eu inocente como elas,
Por isso voava ao céu.

Veio a cobiça da terra,
Vinha para me tentar;
Por seus montes de tesouros
Minhas asas não quis dar.

— Veio a ambição, co'as grandezas,
Vinham para mas cortar,
Davam-me poder e glória;
Por nenhum preço as quis dar.

Porque as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Em me eu cansando da terra,
Batia-as, voava ao céu.

Mas uma noite sem lua
Que eu contemplava as estrelas,
E já suspenso da terra,
Ia voar para elas,

— Deixei descair os olhos
Do céu alto e das estrelas...
Vi entre a névoa da terra,
Outra luz mais bela que elas.

E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Para a terra me pesavam,
Já não se erguiam ao céu.

Cegou-me essa luz funesta
De enfeitiçados amores...
Fatal amor, negra hora
Foi aquela hora de dores!

— Tudo perdi nessa hora
Que provei nos seus amores
O doce fel do deleite,
O acre prazer das dores.

E as minhas asas brancas,
Asas que um anjo me deu,
Pena a pena me caíram...
Nunca mais voei ao céu.








             (Poema de Almeida Garret, imagem retirada da NET)





3 comentários:

  1. Também eu sabia recitar este e outros poemas. Fazia competições com o meu irmão Eugénio para ver quem sabia recitar mais. Ao fim de muitos meses empatámos com a recitação do primeiro canto dos Lusídias

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  2. Adoro este poema que aprendi na minha adolescência.♥️

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